scholarly journals O DOM DO CRIME: IRONIA E FICÇÃO NO TRATO COM O REAL

2013 ◽  
Vol 15 (16) ◽  
Author(s):  
Daniel Martineschen

Neste ensaio examinamos o romance O Dom do Crime publicado por Marco Lucchesi em 2010, considerando as relações intertextuais e o jogo irônico que estabelece com o romance Dom Casmurro, de Machado de Assis. Com base em um referencial teórico recente relativo à ficção histórica e na obra de pensadores franceses como Paul Ricoeur e Jean Baudrillard, procuramos identificar e investigar o jogo estabelecido pelo narrador-autor entre o universo ficcional machadiano e o relato histórico do caso José Mariano, um crime de “honra ferida” comum no século XIX. A narrativa de Lucchesi entrelaça registros jornalísticos e o universo ficcional bem conhecido de Dom Casmurro para subverter a tradicional relação hierárquica entre realidade e ficção. Adotamos o referencial baudrillardiano, juntamente com a reflexão de Ricoeur sobre a discursividade e a falibilidade da memória e com a noção romântica de ironia, para sublinhar a difícil tarefa de se traçar limites entre realidade e ficção, limites esses obscurecidos – se não apagados – ironicamente no romance de Lucchesi.

Author(s):  
Alex Villas Boas ◽  
Jefferson Zeferino ◽  
Andreia Cristina Serrato

O campo de estudos em Teologia e Literatura está consolidado no contexto brasileiro. A proposta do grupo teopatodiceia visa situar este diálogo da teologia como pergunta pelo sentido de Deus na busca de sentido humana e oferta de uma racionalidade crítica a um sistema de crença tendo a literatura como interlocutora privilegiada, mas também outras formas de narrativas e expressões artísticas da condição humana. Nesse sentido, o elemento antropológico visa não somente o diálogo com a antropologia literária mas considera também, desde um projeto de arqueologia do saber teológico, a produção de subjetividades implicadas (pathos) nos saberes em diálogo e nos modelos epistemológicos que melhor favorecem a elaboração de uma teologia pública, plural e contrahegemônica a fim de discernir modos de se responsabilizar por uma agenda pública desde uma sensibilidade ética (diké) comum aos dilemas contemporâneos. A literatura ocupa um papel importante de heterologia no diálogo com a teologia. Como uma abordagem interdisciplinar, o projeto arqueológico se nutre dos percursos teóricos de autores como Antonio Manzatto, Paul Ricoeur, Michel Foucault, Michel de Certeau e David Tracy. Numa crítica à autorreferencialidade teológica, a via dialógica, interdisciplinar e intercultural da perspectiva teológica do grupo se aloca no conjunto das ciências humanas.


2020 ◽  
Vol 45 ◽  
pp. 16
Author(s):  
Conceição Leal da Costa ◽  
Maria Da Conceição Passeggi ◽  
Simone Maria da Rocha

Admitindo que a criança tem o direito assegurado de se expressar sobre questões que lhe dizem respeito, o objetivo deste artigo é discutir a importância de tomar em consideração a palavra de crianças com doenças crônicas, implicando escutar o que têm a dizer sobre as experiências vividas nas travessias entre a saúde e o adoecimento, a escola e o hospital. A pesquisa foi realizada com seis crianças hospitalizadas, recorrendo a uma situação de faz de conta. A base teórica fundamenta-se nas propostas de Jerome Bruner sobre a capacidade da criança em se tornar narradora, nos estudos de Paul Ricoeur sobre a atividade humana de se compreender ao dar sentido à experiência vivida e numa certa visão de aprender para o bem-estar (KICKBUSCH, 2012). As análises permitem discutir a agentividade da criança, sua capacidade para acolher o outro, a importância das classes hospitalares para o seu bem-estar e como se tornam “experts” no convívio com a doença nas transições peculiares de sua condição de criança no convívio com o adoecimento. 


Author(s):  
Norma Sueli De Araújo Menezes ◽  
Julia Morena Costa

Este ensaio objetiva apresentar uma análise da violência presente no livro “Amuleto” do escritor chileno Roberto Bolaño. O romance está contextualizado no início da década de 1970, momento de grandes tensões políticas e de significativa violência no México e do início da ditadura militar-empresarial chilena (1973-1990). Os regimes ditatoriais, embora em circunstâncias diferentes, foram (e são ainda) episódios marcantes que unem os países latino-americanos. Identificaremos as diversas formas de violência ocorridas na América Latina, especificamente, no Chile e no México durante o período mencionado, assim como, qual a relação entre a política e a literatura presentes na referida obra. Os atuais discursos políticos que circulam em nossa sociedade sinalizam que grande parte da população brasileira provavelmente ignora parte significativa da história, inclusive do Brasil, nas décadas de 1960/1970, ou seja, a memória produzida sobre este período não deu conta de fazer conhecer os horrores e as atrocidades cometidos durante os mais de 20 anos de governo militar no país. A partir da abordagem do lugar da poesia e dos poetas na década de 1970, a narradora de Amuleto versa sobre seu papel de defensora da poesia e da memória política do México e do Chile de meados do século XX, de forma indissociável. Com seu discurso circular, calcado na reiteração de eventos traumáticos que presenciou, em especial, à invasão à UNAM, o Massacre de Tlatelolco (1968) e o golpe militar chileno (1973). Neste último fato, relatado pelo personagem Arturo Belano, há um trabalho de escavação memorialística, tanto nas ocorrências históricas mencionadas, como dos intentos poéticos do distrito federal mexicano. Os jovens poetas narrados pela protagonista defendiam o livre trânsito entre vida e poesia, se opunham aos moldes acadêmicos vigentes encarnados na figura de Octavio Paz, como também do poder hegemônico. O movimento poético desses jovens latino-americanos da década de 1970 agrega as muitas inquietações dos seus integrantes. A paixão pela poesia é o princípio básico que dá unidade ao grupo que buscava em cada ato e em cada verso um novo modo de explicar o mundo através de uma poesia sem burocracias, sem espaços de poder e legitimações padronizadas. Este estudo contribui para a indispensabilidade de se manter vivos os horrores e traumas que aconteceram durante os regimes autoritários e as ditaduras militares na América Latina e suas reverberações, considerando, sobretudo, que a memória pode ser um potente instrumento utilizado na reconstrução da história. Serão utilizados textos teóricos e críticos de Paul Ricoeur (1996), Nascimento (2008), Seligmann-Silva (2003), Sarlo (2007) e Rojo (2012), Bolognese (2009), Villarreal (2011), entre outros.


2011 ◽  
Vol 27 (1) ◽  
pp. 347-368 ◽  
Author(s):  
Michel Fabre
Keyword(s):  
De Se ◽  

A expressão "fazer de sua vida uma obra" tornou-se um slogan que necessita ser questionado. Com efeito, se lembrarmos a distinção aristotélica entre ação e produção, práxis e poiese, não se trataria de uma confusão de categorias? Podemos conceber a vida como um modo de produção? Se for de fato uma produção artística, o que significa então pensar a vida sob uma modalidade estética? Não seríamos levados a explicitar as tensões que não deixam de se manifestar entre estética, ética e moral? Enfim, "fazer uma obra de sua vida" supõe antes de tudo desdobrá-la sob a forma de narrativa para poder avaliar o que nos conduz a explorar - na direção de Paul Ricoeur (1984; 1985) - os dilemas da escrita de si.


2021 ◽  
Vol 13 (33) ◽  
pp. e0210
Author(s):  
Cláudia Cristina da Silva Fontineles

O presente texto discute em que medida os meios de representação produzidos pelo e sobre o governo de Alberto Silva, em sua primeira gestão como governador do estado do Piauí (1971-1975), contribuíram para difundir a crença sobre este governo ser o principal responsável pela construção da autoestima piauiense, e por conseguinte, pela formação da identidade piauiense. O texto visa a discutir como esses discursos repercutiram na memória e na história da comunidade local a ponto de se irradiarem até entre os adversários políticos do referido administrador. Defendemos que esse projeto de construção de um ideal otimista não estava restrito ao Piauí, e que tampouco ocorreu de forma isolada e inusitada, como fruto da decisão de um só homem, pois estava articulado à configuração histórica vigente no país. Para tanto, recorremos aos conceitos de identidade – a partir das contribuições formuladas por Stuart Hall e por Zygmunt Bauman; memória – a partir dos estudos realizados por Paul Ricœur e por Michel de Certeau –; e de representação, nas discussões de Roger Chartier. A partir da crítica documental e da metodologia da História Oral, analisamos os documentos oficiais, matérias jornalísticas publicadas em veículos midiáticos impressos de circulação nacional e em televisivos locais, que abordaram esse tema, durante e após o término de seu governo, além de relatos do próprio governador, de seus aliados e de seus adversários políticos, visando a entender como essas construções discursivas influenciaram a história e a memória piauiense. Palavras-chave: História; política; identidade; memória.


2010 ◽  
Vol 14 (2) ◽  
pp. 291-299
Author(s):  
Cláudia Alquati Bisol ◽  
Eduardo Scarantti Bremm ◽  
Carla Beatris Valentini
Keyword(s):  
De Se ◽  

A aprendizagem e a apropriação significativa da língua escrita por surdos podem ser promovidas por meio da utilização de tecnologias de comunicação amplamente difundidas. Este trabalho apresenta a análise dos recursos narrativos utilizados por três adolescentes surdos fluentes em LIBRAS para organizar sua experiência vivida através de produções escritas em weblogs (utilizando a língua portuguesa, sua segunda língua). Trata-se de um estudo qualitativo, do tipo exploratório. Propôs-se uma análise hermenêutica das narrativas baseada em Paul Ricoeur. Apesar dos erros na escrita, as produções puderam ser consideradas como narrativas, pois exprimem tentativas de tecer histórias. Porém, nem sempre a transmissão do sentido foi bem sucedida, indicando dificuldades na aprendizagem da língua escrita e na compreensão de que esta pode ser um meio de comunicação com o outro. Ressalta-se a necessidade de se criar estratégias que reforcem a noção da língua escrita como meio de produção de sentido.


2017 ◽  
Vol 17 (70) ◽  
pp. 93-105
Author(s):  
Nelson Camatta Moreira ◽  
Rodrigo Francisco de Paula

As narrativas sobre a história do constitucionalismo brasileiro ainda predominantes na dogmática constitucional são marcadas por um ressentimento quanto ao passado constitucional, no sentido de que as experiências brasileiras representam a história de um fracasso, ou de uma tragédia, do processo de constitucionalização no Brasil. Assim, pretende-se, neste artigo, a formulação de uma crítica a essa perspectiva da dogmática constitucional, apontando-se, com Hannah Arendt, os pressupostos que justificam a história de um constitucionalismo, com o esforço de recordação do ato de fundação, por meio de narrativas que procuram encontrar uma linha de continuidade, entrecortada por avanços e retrocessos, entre o ato de fundação e os atos seguintes como novos começos que o rememoram. Depois, com Paul Ricœur, aponta-se que o ressentimento encontrado nas narrativas sobre a história do constitucionalismo brasileiro impede a memória do passado constitucional, resultando na impossibilidade de se fazer uma história do constitucionalismo brasileiro, o que mantém a eternidade e a permanência do fracasso, ou da tragédia, da Constituição e do processo de constitucionalização no Brasil. 


2020 ◽  
Author(s):  
Andréa Lima do Vale Caminha
Keyword(s):  
De Re ◽  
De Se ◽  

A questão que queremos investigar é saber em que medida a relação passado-presente-fu­turo, marcada por recordações traumáticas, não exigiria o ato de perdoar como forma de se alcançar a cura dessas recordações? Nosso ponto de partida para tratar dessa questão foi o texto O perdão pode curar? , de Paul Ricoeur, filósofo e estudioso da Psicanálise Ricoeur afirma que a atitude de não perdoar nos faz ficar doentes. Na nossa compreensão, quando se perdoa, não se está esquecendo, mas eliminando-se uma dívida por meio de uma atitude generosa de ressignificar os fatos do passado que não se pode mudar, mas lhe atribuir um novo sentido. Dessa maneira, o perdão é libertador, pois ele é cura para a memória, que pode ser encarada não apenas como uma ferramenta de guardar dados mnemônicos, mas, sobretudo, como uma capacidade de (re) significar ou (re) criar o passado.


1994 ◽  
Vol 2 ◽  
Author(s):  
Jean-Pierre MEUNIER ◽  
Caroline HUYNEN ◽  
Marc LITS ◽  
Christine MASUY ◽  
Gérard DEREZE

"Henri ATLAN et Caroline BOUSQUET: Questions de vie", par Jean-Pierre MEUNIER; "Jean BAUDRILLARD et Marc GUILLAUME: Figures de l'altérité", par Caroline Huynen; "Luc COLLéS: Littérature comparée et reconnaissance interculturelle", par Marc LITS; "Daniel DUBUISSON: Mythologies du XXe siécle", par Caroline Huynen; "Denis DUCLOS: Le complexe du loup-garou", par Marc LITS; "Denis HUISMAN: L'âge du faire", par Christine Masuy; "Jean-François LACAN: Michael PALMER et Denis RUELLAN, Les journalistes. Stars, scribes et scribouillards", par Gérard Derèze; "Olivier MONGIN: Paul Ricoeur", par Marc LITS; "Daniel SCHNEIDERMANN: Arrêts sur images", par Caroline Huynen; "Geneviéve ZARATE: Représentations de l'étranger et didactique des langues", par Marc LITS


2018 ◽  
Vol 40 (2) ◽  
pp. 33677
Author(s):  
Renato Novaes Chaves ◽  
Maykon Dos Santos Marinho ◽  
Luciana Araújo dos Reis

 O objetivo desta pesquisa é analisar a concepção de memória na ficção romancista: Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, e na obra A Memória, A História e o Esquecimento, de Paul Ricoeur; bem como apresentar algumas singularidades da referida obra machadiana à luz da teoria deste último. O corpus constituiu-se em bases bibliográficas, sendo que as fontes secundárias foram obtidas a partir do romance de Machado de Assis e da obra de Ricoeur. Procedeu-se a análise crítica dos livros por meio de uma revisão narrativa. Os resultados evidenciaram que Ricoeur entende a memória como uma experiência que o indivíduo tem de ressignificar ou representar; a memória é tratada e discutida na perspectiva de atribuir um dever de legitimação. Em Machado de Assis, tem-se uma descrição qualitativa da memória como uma experiência vivida. Ele revela diferentes aspectos da memória, uma vez que as lembranças são usadas de um modo muito dinâmico. As singularidades mostraram que em Brás Cubas a memória, empregada enquanto recurso artístico, revela-se autêntica, pois a lembrança evocada pelo protagonista confere à memória um significado de verdade. 


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