“Essas mentiras, caro doutor, vão tornar-se verdades indiscutíveis”: memórias subterrâneas, violência e legitimidade em O anjo branco, de José Rodrigues dos Santos
O objetivo deste artigo e discutir o romance O anjo branco, de Jose Rodrigues dos Santos, a partir da ideia do campo literário como um arquivo de memorias que se confrontam em disputa por uma autoridade narrativa sobre um tempo e a legitimidade dos seus acontecimentos específicos. O autor se coloca como representante de sua comunidade de memória e teatraliza, no palco de sua narrativa, uma argumentação ideológica interessada muito mais na representação do que chama de “espírito do tempo” do salazarismo do que na reconstituição factual das ocorrências. Esta noção das intenções que sustentam as ações do regime está intimamente relacionada a base das teorias contratualistas que justificam o monopólio e a utilização da violência por parte do poder público quando visam o bem comum. Assim, o artigo discute a relação entre história, memoria, política e literatura a partir de teóricos como Thomas Hobbes, Hayden White, Micheal Pollack, Margarida Calafate Ribeiro e Diana Klinger.